Autor: Dr. Marcelo Marques Tusi
A apicultura apresenta grande destaque na Região Sul do Brasil. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no ano de 2015, foram produzidas 4,96 mil toneladas de mel no Rio Grande do Sul, sendo o segundo maior produtor brasileiro. Na cidade de Santiago, no mesmo ano, foram produzidos 66.725 kg de mel, enquanto Jaguari foi responsável pela produção de 46.144 kg.
Neste contexto, no ano de 2014, a URI Câmpus de Santiago iniciou estudos para avaliar as propriedades de amostras de méis de abelhas africanizadas (Apis mellifera) produzidas no Rio Grande do Sul. Nesta fase inicial, foram estudados méis de onze municípios do Rio Grande do Sul, avaliando propriedades físico-químicas e microbiológicas. No ano de 2016, deu-se início a uma nova fase na pesquisa relacionada a méis: avaliar as propriedades de méis de meliponíneos, também denominados abelhas nativas ou abelhas sem-ferrão. Tais abelhas produtoras de mel, conhecidas como “Meliponas” (Apidae, Meliponinae), já existiam no continente antes da chegada da abelha estrangeira Apis mellifera L. Nas regiões tropicais e subtropicais existem mais de 400 espécies descritas de abelhas sociais que podem produzir mel.
Tais abelhas são dóceis, de fácil manejo e necessitam de pouco investimento para a sua criação. As abelhas meliponíneas que podem ser encontradas no Brasil são as espécies borá (Tetragona clavicepes), jataí (Tetragonisca angustula), jandaíra (Melipona subnitida), mandaçaia (Melipona quadrifasciata), mirins (Plebéia sp) e uruçu nordestina (Melipona scutellaris).
Os meliponíneos são responsáveis por 30% a 90% da reprodução das plantas nas florestas tropicais por meio de polinização e fecundação cruzada.
A Tetragonisca angustula é um meliponíneo de pequeno porte, popularmente conhecida como Jataí. Esta abelha possui ampla distribuição geográfica, ocorrendo naturalmente nos Estados do Amazonas, Amapá, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Mato Grosso, Pará, Paraíba, Rio de Janeiro, Rondônia, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo. Há duas subespécies de T. angustula identificadas como T. angustula Latreille (com mesocoxa preta) e T. angustula Fiebrigi (com mesocoxa amarela). Esta última é restrita ao sul do Brasil, Paraguai e províncias do nordeste da Argentina, incluindo Misiones, Chaco, Formosa e Corrientes. Tais abelhas são menores que as abelhas Apis mellifera, com asas mais curtas. Elas constroem pequenos ninhos em cavidades de árvores ou galhos e também em partes subterrâneas. As abelhas jataí são facilmente adaptáveis e bastante mansas, podendo ser criadas em áreas rurais ou urbanas. Como não apresentam ferrão, seu manejo é mais fácil, dispensando o uso de equipamentos de proteção e viabilizando o emprego de mão de obra familiar. Colônias fortes de abelhas jataí podem fornecer entre 0,5 e 1,5 L/ano de mel. Assim, apesar de a quantidade produzida por colônia ser baixa, é muito apreciado, pois seu sabor é peculiar. O mel de Tetragonisca angustula é mais líquido comparado ao mel de abelhas do gênero Apis e é mais rapidamente absorvido pela pele.
Apresenta efeitos imunológico, anti-inflamatório, analgésico, sedativo, expectorante, hipossensibilizador e antibacteriano. A composição do mel é muito variável uma vez que depende não só da sua origem floral e da espécie de abelhas que o fabricam como também das condições ambientais da zona onde é produzido (tipo de solo e clima) e do
modo como é recolhido e posteriormente processado.
Assim, levando em conta as características das abelhas sem-ferrão e da relação da composição do mel com as condições ambientais do local de produção, o referido projeto visa desenvolver uma metodologia para utilizar o mel de abelhas sem-ferrão, Jataí (Tetragonisca angustula), como um indicador de condições ambientais nas zonas urbana e rural. Para tanto, serão analisados parâmetros físico-químicos (umidade, pH, acidez, atividade diastásica, condutividade elétrica, teor de cinzas entre outros), microbiológicos (contaminações por microorganismos como, por exemplo, Clostridium botulinum, Escherichia coli bem como fungos, bolores e leveduras), e avaliar a presença de metais e defensivos agrícolas nos méis.
Para que a URI – Câmpus de Santiago possa realizar as referidas ações, tem se montado uma infraestrutura que vai desde a criação e multiplicação de enxames e rainhas (Apiário Modelo da URI) até a modernização de laboratórios para análises das amostras de mel. Tais instalações são construídas com recursos advindos da Secretaria do Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul e da URI. A captação destes recursos se dá por meio de editais próprios destinados aos pólos gaúchos, neste caso, o Pólo de Modernização Tecnológica do Vale do Jaguari.
Além de desenvolver uma metodologia de avaliação ambiental utilizando o mel de abelhas Jataí como indicador ambiental, o projeto também visa divulgar as vantagens da Meliponicultura e capacitar produtores da Região do Vale do Jaguari para o desenvolvimento da atividade na região. Tais iniciativas mostram que Santiago está em consonância com outros grandes centros brasileiros.
Em Curitiba – PR, por exemplo, serão implantados no mês de setembro os chamados Jardins de Mel de forma a estimular a presença de abelhas sem- ferrão, responsáveis por boa parte do cultivo agrícola e disseminação de árvores nativas. O projeto prevê o plantio de espécies melíferas e a distribuição de caixas de meliponíneos em diversos parques da cidade.